quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Natal, o ópio da individualidade.

“O trabalho escravo e nosso pequeno universo
Toda a hipocrisia e toda a afetação
Todo o roubo e toda a indiferença” 
Legião Urbana


Merry Christmas para a hipocrisia!

Desde criança, quando descobri a farsa da existência do então São Nicolau (também chamado de Papai Noel), que me questiono: O que essa data realmente significa?

Famílias felizes, presentes, abraços, vinho, champagne, banquetes, arvore de natal, nascimento de Jesus. Dizem que vai além, que representa paz, amor, fraternidade e Felicidade. Isso realmente significa o Natal? 

Bem, vamos parar um pouco refletir e observar este momento festivo.

Em relação ao Natal, como vemos, é um período que engloba muito mais que o próprio Natal, incluindo duas/três semanas antes do fatídico dia 24-25 de dezembro, onde começa período de enfeites, compras, convites indo até o Réveillon onde um novo e próspero ano novo nos aguarda.

Sem dúvidas esse período brinda a hipocrisia que o capitalismo traz consigo. 

Talvez você, que deve estar perdendo seu valioso tempo, se pergunte o porquê de tantas criticas. Onde está à hipocrisia? E que relação há desta data com o capitalismo?

Como disse Cynara Menezes, publicado em Socialista Morena, “O Natal é uma verdadeira cilada. TVs, jornais, familiares, tudo conspira para que você se sinta tomado pelo “espírito natalino” (1), você é programado desde muito pequeno a se enfurnar em lojas, shoppings, supermercados para comprar, comprar, comprar... Indo para além da necessidade de uso próprio ou de seus familiares. 

Todas as classes não percebem o quanto é desnecessário tamanho consumismo. Não é necessário dar presentes, provas de amor, de amizade apenas em uma data que celebre amor, paz e fraternidade. Ou apenas com presentes e durante o natal que celebramos tais sentimentos?

Enquanto surgem dívidas de compras, mais explorações de trabalhadores na fabricação e venda de produtos, multiplicam-se. Um circuito intenso de lucro em torno dessa ilusionista felicidade de comprar. Uma falsa sensação de felicidade, paz e amor cresce absurdamente gerando mais desigualdade.

Uma data para comemorar o amor. Onde se encaixaria o amor? O amor onde o homem explora o homem e é moderado a endividar-se para comprar presentes que representem amor? O amor onde somos consumidos por uma rotina destruidora de trabalho quem não temos tempo para nossos filhos, pais, familiares e amigos? Uma data onde recebemos a liberdade de comemorar o amor que nos é privado todo o restante do ano?

E que liberdade é essa? Tão individual, tão egocêntrica. Como diria Bakunin, “a liberdade do próximo estende a minha ao infinito” (2). O capitalismo nos passa essa falsa sensação da ‘minha própria liberdade’. Como se vivêssemos sozinhos numa redoma própria. É este o espírito do Natal?

Onde se encaixaria a paz? Onde temos um sistema excludente que a dominação vem por meio do genocídio de classes, de etnia, de gênero, de sexo? Que paz é essa em que países são invadidos em busca de riquezas, interesses políticos, estratégicos? Que paz é essa que trabalhadores matam e oprimem trabalhadores para ganhar um misero salário (os policiais passam por isso)?

Talvez ainda possam dizer, mas é uma data comemorativa o nascimento de Jesus. Jesus pregava o amor, a fraternidade e a paz (segundo a própria Holly Bible e as palavras que os cristão pregam). Pregava sim, mas não pregava a mentira de achar que durante uma data devemos nos empanturrar de comida enquanto milhões passam fome. Não a mentira de embelezar ruas enquanto aumenta a cada dia, a ausência de saúde, desemprego, fome e miséria. Que fraternidade é essa? (3)

Como diria Errico Malatesta “Se eu como, não posso fazê-lo com gosto se penso que há gente que morre de fome; se compro um brinquedo para minha filha e me sinto muito feliz por sua alegria, minha felicidade logo se amarga ao ver que, diante da vitrine da loja há crianças com os olhos arregalados que se contentariam com um brinquedo que custa apenas algumas moedas, mas que não podem comprá-lo; se me divirto, minha alma se entristece assim que penso que há infelizes companheiros que definham nas prisões; se estudo ou realizo um trabalho que me agrada, sinto uma espécie de remorso ao pensar que há tantas pessoas que têm maior talento que eu e se vêem obrigadas a perder sua vida em tarefas exaustivas, muitas vezes inúteis ou prejudiciais. Claramente, puro egoísmo, mas de um tipo que outros chamam altruísmo (...)" (4).

Esta é fraternidade, amor e paz que nos falta. O sentimento de sofrimento comum. Que a desigualdade vem de algo que tanto me explora como explora aquele que não tem nada. 

Mas isso ainda é corrompido pelo capital, até esse sentimento de ajudar o próximo. É passada a ideia de ajuda momentânea como se as mazelas sociais não tivessem cura e o simples fato de doar algo (seja comida, brinquedo, roupa ou um simples enfeite natalino) fosse um grande feito. Na verdade funciona, esta caridade, como um ópio social. Aliviando momentaneamente dores e problemas profundos. Os problemas de uma sociedade doente e falida.

A hipocrisia está na falsa sensação de escondermos e demonstrarmos o que realmente não existe. De aceitarmos momentos, ilusões da perfeição inexistente, indo além de um futuro que não existirá.

Chega a ser nojento o que ocorreu numa cidade do interior do Piauí, onde a prefeitura alugou um helicóptero que trazia a bordo um “Papai Noel” com presentes para distribuir para crianças da cidade e lanches para idosos e adultos 5,6. Claro, que o gasto deve ter sido significativo para os cofres públicos desta cidade. Sem falar que a alegria temporária de uma criança vale muito mais para a prefeitura do que dar cultura, educação de qualidade, esporte, saúde e lazer de uma forma continua.  

E essa atitude é passada como boa pela mídia hegemônica e essa ideia é posta como a única solução para que a façamos e para que a propaguemos.

Pois é caro leitor, o capitalismo ele usa o Natal como uma tática adestradora. Insere-se como um câncer social e se apropria de tudo. Ameniza dores para que não vejamos a causa da dor. Utiliza-se de crenças, amor, paz e fraternidade para haver mais exploração, mais guerras e mais ódio. Passando a ideia que a cada ano virá à prosperidade para todos, a paz e o amor. 

Miguel Coutinho Jr. - GEAPI Núcleo Teresina.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

1) MENEZES, Cynara. O homem que roubou o Natal de Jesus. In: Folha Social. Disponível em:< http://www.folhasocial.com/2013/12/o-homem-que-roubou-o-natal-de-jesus.html> Acesso em 24 de dezembro de 2013.

2) BAKUNIN, Mikhail. O Conceito de Liberdade. Porto: Rés limitada, 1975.

3) Jesus o maior anarquista. In: Anarquismo. Disponível em: <http://www.anarquista.net/jesus-o-maior-dos-anarquistas/> Acesso em 23 de dezembro de 2013.

4) MALATESTA, Errico. Anarquismo e Anarquia. _______: Faísca, 2009

5) VIEIRA, Silvio. Helicóptero pousa no estádio em evento promovido pela prefeitura. In: Clique Piripiri. Disponível em: <http://www.cliquepiripiri.com.br/noticias/helicoptero-pousa-no-estadio-em-evento-promovido-pela-prefeitura> Acesso em 24 de dezembro de 2013.

6) VIEIRA, Silvio. Natal solidário da UBS 21. In: Clique Piripiri. Disponível em: <http://www.cliquepiripiri.com.br/noticias/natal-solidario-da-ubs-21> Acesso em 24 de dezembro de 2013.

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